O encontro permitiu traçar uma visão completa sobre o momento que Portugal vive no setor dos data centers, reunindo perspetivas de mercado, engenharia, sustentabilidade, energia e arquitetura. Ao longo da sessão destacou-se a combinação entre potencial estratégico, desafios de infraestrutura e a necessidade de abordagens multidisciplinares que garantam projetos mais eficientes, sustentáveis e integrados no território.
Na sua apresentação, Lourenço Sousa Coutinho (CBRE), salientou que Portugal reúne um conjunto de fatores que o posicionam como o próximo hub europeu de data centers: um posicionamento geo-estratégico que o torna ponto de interligação entre a Europa, as Américas, África e Ásia; uma conectividade internacional muito robusta, com cerca de 19 cabos submarinos previstos até final de 2026, ligando a costa portuguesa a cinco continentes e a cerca de 60 países; e uma infraestrutura terrestre de fibra ótica capaz de assegurar ligações de baixa latência para o resto da Europa. Referiu também que os pedidos de ligação para novos projetos já excedem largamente a capacidade atualmente disponível na rede elétrica, sublinhando a necessidade de criar mecanismos de planeamento, previsibilidade e de controlo da especulação no setor.
João Rocha (QUADRANTE) destacou que os data centers são uma continuação natural do trabalho da empresa em infraestruturas críticas e que estes projetos exigem uma abordagem verdadeiramente multidisciplinar. Referiu que o mercado em Portugal, Espanha e Brasil está a crescer perto de 15% ao ano, mas que a energia se tornou o principal limite ao desenvolvimento: existem cerca de 26,5 GW pedidos por investidores, muito acima do pico de consumo nacional, o que obriga a reforçar a rede e a repensar soluções como geração local e armazenamento. Sublinhou ainda que a evolução tecnológica, sobretudo impulsionada pela inteligência artificial, está a aumentar significativamente as densidades e a pressão sobre o cooling, tornando essencial integrar engenharia, energia, arquitetura, sustentabilidade e licenciamento desde o início
Pedro Malheiro (LMSI ENGINEERING) destacou que Portugal tem já muitos anos de experiência no desenvolvimento de data centers, embora tradicionalmente com projetos de menor dimensão, e que a nova vaga de investimentos coloca o país perante níveis muito superiores de potência, densidade e complexidade técnica. Enfatizou que as empresas de engenharia portuguesas devem ser encaradas como parceiras estratégicas, capazes de criar valor local, desenvolver competências alinhadas com padrões internacionais e contribuir para um ecossistema mais forte, apoiado na partilha de conhecimento e na atuação de entidades como a Portugal DC.
Guillem Richard (PGI DATA CENTERS) explicou que entre 2 a 3% das emissões globais de gases com efeito de estufa estão associadas aos data centers e que, perante o crescimento acelerado da digitalização e da inteligência artificial, o setor enfrenta uma pressão crescente em energia e carbono. Defendeu que a descarbonização só é eficaz quando integrada desde as fases iniciais de conceção, através de metodologias de análise de ciclo de vida, escolha de materiais de baixo carbono, otimização do desenho e integração de energia renovável. Sublinhou ainda que regulamentos europeus cada vez mais exigentes — como a UE Taxonomy, a CSRD e diretivas de eficiência energética — estão a tornar obrigatório medir, reduzir e justificar emissões reais ao longo do ciclo de vida dos projetos.
Gonçalo M. Santos (ARX PORTUGAL ARQUITECTOS) apresentou o caso do data center de Sines, sublinhando o papel estratégico do projeto para posicionar Portugal como um polo global. Explicou que Sines oferece terreno disponível, elevada conetividade internacional, energia 100% renovável e soluções de arrefecimento extremamente eficientes baseadas no reaproveitamento de água do mar. Destacou ainda a importância da integração no território e da criação de espaços verdes e ecossistemas recriados, bem como a necessidade de soluções flexíveis e preparadas para a evolução tecnológica, incluindo novos requisitos associados à inteligência artificial.
Duarte Pape (PARALELO ZERO) sublinhou que, embora o setor fale sobretudo de potência, racks, energia e investimento, discute-se muito menos o contributo dos data centers para a cidade e para o território. Defendeu que a arquitetura deve trazer uma visão mais ampla, capaz de integrar estas infraestruturas no contexto urbano e territorial, explorar sinergias económicas e ambientais e antecipar a rápida evolução tecnológica. Realçou ainda a importância de soluções adaptáveis e flexíveis, que evitem a criação de edifícios demasiado rígidos ou rapidamente obsoletos, e frisou que a arquitetura tem um papel central na síntese entre técnica, funcionalidade e impacto a longo prazo.
O evento terminou com um debate moderado por o Arquitecto Pedro Duarte Bento, onde se reforçou a importância da colaboração entre promotores, projetistas, operadores, municípios e reguladores para que Portugal possa consolidar a sua posição num setor estratégico e em plena transformação.